IBGE e estudioso negam ter afirmado que trans vivem até 35 anos

As duas principais fontes às quais é atribuído dado sobre expectativa de vida rechaçam autoria. Antra admite não haver estudos sobre o tema

Publicado em 14/02/2021
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Número está em reportagens, estudos e documentos governamentais, mas não há base científica. Foto: Depositphotos

Trata-se de um dos números mais citados em palestras, estudos, discursos ativistas, documentos governamentais e reportagens jornalísticas sobre a vivência de travestis e transexuais no Brasil.

Entretanto, não há fonte científica que dê base para assegurar que a expectativa de vida de uma pessoa trans no País seja 35 anos. 

A primeira negativa de que haja cálculos que chegam a esse número é do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

No geral, é expresso em falas e textos que uma pessoa trans no Brasil, em média, não vive mais que 35 anos junto com o dado de que a expectativa de vida do brasileiro é 75,5 anos de acordo com o IBGE. 

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A segunda parte da sentença, tanto pelo número quanto pela fonte de onde ele vem, está correta. Entretanto, por erro de informação, é comum ver o dado sobre pessoas trans atribuído ao IBGE. O órgão rechaça essa ligação. 

"Não possuímos dados sobre a população trans", respondeu a assessoria de imprensa à nossa reportagem. 

Outra possível origem daquela conclusão também é negada. Na página 42 do Dossiê Assassinatos e Violência contra Travestis e Transexuais Brasileiras em 2020, produzido pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), a informação de que a expectativa de vida do segmento é de 35 anos é atribuída a "Antunes (2013)".

O estudo não tem referência bibliográfica, mas pesquisa mostra que a citação trata do livro "Travetis Envelhecem?", do psicólogo Pedro Paulo Sammarco Antunes. 

À reportagem, o estudioso nega que tenha feito aquela afirmação. 

"O que há no meu livro é entrevista com Keila Simpson, que fala algo por volta daquele número. O correto seria não me citar como fonte direta ou dizer que eu afirmo, mas sim falar que o dado é fornecido por ela em entrevista para meu estudo, o qual se tornou livro", disse. 

Keila Simpson é atual presidente da Antra. Tanto na entrevista dela a Pedro quanto nos relatórios de assassinatos da entidade, não é mostrada metodologia que embase a afirmação. 

A inexistência de fonte científica para afirmar que a expectativa de vida de pessoas trans é 35 anos está expressa em importante relatório de 2014 acerca do tema, o An Overview of Violence Against LGBTI Persons, da Inter-American Commission on Human Rights.

Aí é apenas dito que entidades de direitos humanos informaram à comissão autora do texto de que a expectativa de vida do segmento estaria entre 30 e 35 anos no continente americano. Não há exposição de como se chegou a essa conclusão.

Em seguida, é citado o fato de que 80% das pessoas trans assassinadas no continente americano tinham até 35 anos de idade. Entretanto, o próprio relatório não assume tal fato como parâmetro para determinar expectativa de vida, o que seria um erro.

Para ter esse dado seria necessário conhecer a idade de todas pessoas trans mortas por quaisquer causas na região e não apenas as assassinadas, algo que não existe no Brasil, como a própria Antra reconhece, embora de forma contraditória, no dossiê. 

É admitido pelo coletivo ativista "não haver estudos sistemáticos sobre a expectativa de vida das travestis e transexuais femininas", para, em seguida, citar Antunes como fonte do dado, algo que ele, enfim, nega.

Procurada para falar das negativas sobre a fonte a respeito da expectativa de vida de pessoas trans no Brasil, a Antra não retornou nosso pedido de entrevista. 


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