Quanto mais nos descobrimos iguais, mais vemos o que nos diferencia

Publicado em 02/11/2015

Quanto mais nos descobrimos iguais, mais vemos o que nos diferencia, diz Padre Beto

Dzi Croquettes
Acredito que poucas pessoas conhecem o grupo Dzi Croquettes, que se tornou símbolo da contracultura e chegou a confrontar a ditadura militar ao usar a ironia e a inteligência. O filme Dzi Croquettes, de Raphael Alvarez e Tatiana Issa, mostra os espetáculos que revolucionaram os palcos com homens de barba e pernas cabeludas com sapatos de salto alto e roupas femininas.

O grupo se tornou um enorme mito na cena teatral brasileira e parisiense nos anos 1970. Ao assisti-lo, hoje, podemos perceber a influência que muitos artistas tiveram ao desenvolver o seu trabalho, como Elis Regina, Secos & Molhados, Frenéticas e muitos outros. Alem de toda criatividade e arrojo do grupo, o documentário deixa claro sua mentalidade revolucionária para a época.

Os membros do Dzi Croquettes não se compreendiam como homens ou mulheres, mas simplesmente como seres humanos e procuravam disseminar esta visão por meio do estranhamento que causavam na forma de se comportar, dançar e se vestir.

A riqueza de sermos simplesmente humanos
Por incrível que pareça, em pleno século 21, as pessoas ainda se rotulam e se preocupam com os rótulos: homem, mulher, gay, lésbica, padre, pastor, religioso, ateu, evangélico, católico, umbandista, brasileiro, estrangeiro, negro, branco, rico, pobre, corintiano, palmeirense etc. É claro que cada um deve possuir sua identidade e conhecê-la com profundidade para não cair na incoerência. Mas o problema não é a identidade que assumo, mas a criação de rótulos.

O rótulo, como costumamos usar a palavra, ao mesmo tempo em que diferencia as pessoas em grupos, as padroniza. Rotular as pessoas significa padronizá-las e retirar delas um dos direitos fundamentais do ser humano: a liberdade. Milton Santos, um dos maiores pensadores que o Brasil já teve, afirmou, em uma de suas últimas entrevistas, que a humanidade encontra-se ainda em uma fase embrionária. Isso é uma grande verdade.

Os seres humanos não se compreendem como seres humanos. Os seres humanos estão longe de realmente se tratarem como uma humanidade e, ao mesmo tempo, se respeitarem em sua individualidade e em sua liberdade. Mas, não é por esta constatação que devemos nos acomodar. Se faz sim necessário aprofundar dois conceitos que parecem divergentes, mas que se completam mutuamente: a igualdade e a liberdade.

Os seres humanos precisam compreender que são iguais, que são feitos do mesmo material, são seres humanos. Como tais devem possuir direitos fundamentais iguais, como o direito ao trabalho, ao estudo, alimentação, saúde etc. Ao mesmo tempo, possuem responsabilidades fundamentais iguais. Todos são responsáveis pela sociedade, pelo que temos em comum e que chamamos de público. Porém, ao compreendermos o que nos iguala, justamente encontramos o que nos diferencia.

Ser humano significa ter a mesma condição de ser único, diferente, ou seja, ter a liberdade de viver sua identidade própria e ser respeitado nela. Somos iguais e diferentes, porque somos seres humanos. E somente nesta dinâmica da liberdade e da igualdade podemos melhorar, ao mesmo tempo, nossa vida social e individual.

Se a liberdade e a igualdade não são confrontadas com as circunstâncias concretas da vida, corremos o risco de nos padronizar e, ao mesmo tempo, nos dividir em castas e nos afastarmos, criando preconceitos e fantasmas. Um exemplo bizarro e absurdo de uma sociedade sem igualdade e sem liberdade foi o do pai e filho que estavam abraçados em público e foram vistos como um casal gay. As pessoas se esquecem que não importa a qualidade do caixão, todos irão para uma cova.


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