Dublador de RuPaul no Brasil fala do desafio de dar voz à 'mama'

Com 23 anos de trabalho, Jorge Lucas é assertivo: 'Não se trata de programinha de bichinhas afetadas.'

Publicado em 13/08/2015
jorge lucas ru pauls drag race
''Existe preconceito tolo contra dublagem no Brasil'

Com colaboração de David Denis Lobão.

Não, não é "Sashay away". É "Sashay, pode ir"! De volta à TV brasileira, mais precisamente no canal Multishow, o reality RuPaul's Drag Race não causa burburinho apenas pela disputa dentre tantas drags poderosas. A dublagem em português também provoca algumas contendas. Uns gostam, outros eliminam já de primeira. Entonação, traduções das gírias... As redes sociais viram palco para avaliações.

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No centro dessa divisão de gostos, está o ator Jorge Lucas, 48 anos, que empresta suas cordas vocais à Mama Ru. Com 23 anos de trabalho em dublagem, ele tem em seu currículo interpretações de Fox Mulder (Arquivo X), Vin Diesel, Jamie Fox, Ben Affleck e muitos outros. É com essa trajetória que Lucas defende seu trabalho no reality. 

"Fizemos nossa pesquisa de terminologias, de gírias a serem empregadas sem cair no estereótipo bobo e preconceituoso. Queremos aquilo que está na boca de amigos e amigas, colegas de trabalho e na nossa também. O dito 'vocabulário gay' é popular, corrente e usual. Além disso, o canal, dono do produto, também mandou uma série de termos usáveis e outros desnecessários."

A defesa do trabalho de toda equipe de dubladores, do tradutor e da diretora Angélica Borges, da Beck Studios, do Rio de Janeiro, tem como base a seriedade dada à atração, diz Lucas. 

"Temos a responsabilidade de fazer a versão brasileira de um ícone, não só gay, mas cultural. Um artista camaleônico que canta, representa, apresenta, produz, dança, inspira e serve de modelo a outros seres humanos que tem a mesma verve dentro de si e que ainda não haviam se visto representados. Não estamos 'dublando um programinha de bichinhas afetadas', muito pelo contrário, é um nicho artístico-cultural fortíssimo, cada vez mais atuante, influente e marcante na sociedade contemporânea."

No programa, com tantas alfinetadas, disputas, alegrias e decepções, fica mais a tensão em evidência. O oposto do que ocorrre no estúdio, diz o ator. O clima aí é divertido, descontraído e, ao mesmo tempo, o mais profissional possível. Dentre tanta fluência de coisas positivas, muitos colocam palavras nas traduções que eles trazem do próprio cotidiano. "Evitando, sempre, qualquer termo pejorativo, preconceituoso e desrespeitoso", avisa imediatamente.

E há um desafio específico em fazer esse trabalho, atesta. "O trabalho do ator em dublagem para RuPaul's Drag Race é muito difícil pela dificuldade de não descaracterizar os seres humanos que ali se apresentam, suas almas e trejeitos. Há uma enorme pesquisa feita pela tradução para que o que chegue ao público seja a mais fiel, natural e coloquial dento do português."

E há similitudes entre o que é dublado e quem dubla. O quê? A discriminação. "Existe um preconceito tolo em relação à dublagem no Brasil. Não somos um povo que domine seu idioma, mesmo porque o português é dificílimo, imagina o idioma original do programa, ainda mais aquele inglês extremamente coloquial e setorizado do ambiente gay/drag. Dublar, em vários países, é visto como forma de proteger e propagar a língua pátria", defende.

Enfim, sejamos menos venenosas, não é mesmo?! Repitamos: "Sashay, você fica!"


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